18-19 de agosto de 2001
Fiquei muito familiarizado com o aeroporto de Yangon depois de passar dois dias carregando os galões de gasolina pelo terminal internacional, aos olhos atônitos dos passageiros. Não havia nenhum funcionário do aeroporto que não soubesse do maluco brasileiro tentando decolar de Yangon em plena época das monções. Ouvi vários comentários do tipo “Rezo por você todos os dias para que o tempo melhore.”
Ainda estava chovendo no sábado, claro. Quando sai as 07h30, o teto me parecia mais alto. A sala da meteorologia não tinha as fotos por satélite e pouco sabia sobre as condições do tempo em geral. Que sorte que Margi e Lelo me passaram as previsões do tempo e as fotos do satélite baixadas por internet, então pude ver que o pior tempo estava situado logo acima de Yangon.
Depois da minha fracassada tentativa de sair no dia anterior, optei por um rumo ao oeste o que acrescentaria uma hora a mais para meu vôo. Assim, deveria alcançar o mar antes da cadeia de montanhas. Desta vez tinha mais gasolina a bordo: comprei sete galões, ou seja 100 litros de gasolina de carro (vermelha!) de 92 octanos.
Durante duas horas, entrei numa batalha contra uma linha de CBs. Finalmente, desisti de contorna-los. Voei baixo, a 1.000 pés, mesmo algumas vezes a 100 pés, sobre o mar. Às vezes, entrei na chuva abaixo das nuvens carregadas, mas minha experiência com as particularidades das monções está crescendo: aprendi que bem cedo na manhã não há ventos fortes. Abaixo das minhas asas, vi muitos pescadores enfrentando o mau tempo em barcos aparentemente frágeis. Como eu, deveriam estar encharcados. Senti pena deles por estarem nestas condições em pequenos barcos e eles provavelmente sentiram pena de mim!
Depois de uma hora, como Margi tinha antecipado, sai do pior: o céu clareou, e até vi uns pedaços de céu azul. Subi a 3000 pés e consegui entrar em contato com os aeroportos ao longo da costa de Myanmar. De repente, surpresa boa: ventos de cauda aumentaram minha velocidade de solo para 120 nós. Quando estava no través de Sittwe, antes da fronteira de Bangladesh, me senti confiante pelo bom tempo e decidi seguir diretamente para Patna na Índia, como já tinha permissão válida. Pedi ao controle de Sittwe para transmitir uma mensagem ao Controle de Yangon mudando meu destino de Chittagong para Patna. Só para evitar problemas na chegada da Índia, também chamei o tráfego aéreo de Yangon pelo telefone satelital da Nera para ter certeza que eles haviam entendido bem.
No caminho, voando no través de Calcutá a 120 nós em um céu aberto a 8.500 pés de altitude, só desviando às vezes de CBs isolados, fiz contato com o controle de Calcutá e a confusão começou, como já esperava. Paciência. Poderia sempre voar de volta a Chittagong. A complicação estava no fato de que a minha autorização dizia que meu vôo teria origem em Chittagong e não em Yangon. Visto que eu possuía uma autorização legítima, não podia entender que diferença isto fazia. Depois de várias discussões, me permitiram prosseguir. Faltavam apenas 250 milhas para Patna.
Na aproximação a Patna, fui informado que só tinha 800 pés de teto com 1.5 km de visibilidade e que o aeroporto estava fechado para operações visuais. Experiências anteriores com isso na Índia me fez continuar. Com toda razão. Avistei o aeroporto a 10 km de distância e fui para o pouso!
Um batalhão de pessoas me esperava no asfalto. Tinha voado 9 horas no pior tempo do mundo para um vôo visual e ainda por cima sem piloto automático. Estava exausto, mas feliz o suficiente para encarar um exército de burocratas. Mesmo assim, conseguiram me cansar mais ainda: 3 horas e 20 minutos para sair do aeroporto! Comparado com a alfândega em Tapachula, Mexico: 15 minutos! A aeronave foi oficialmente lacrada e tive que assinar uma declaração dizendo que não tinha nenhum equipamento fotográfico a bordo e que não tiraria nenhuma fotografia.
No dia seguinte, tinha um vôo longo para Bombaim mas o aeroporto só abria às 08:00. Eu não tinha sido autorizado a quebrar o lacre do avião até um oficial estar presente. Finalmente, consegui decolar. Havia poucas nuvens a 800 pés, e outra camada a apenas 3000 pés. A boa vida não durou muito. Próximo a Khajuraho, famoso por seus templos eróticos, havia nuvens por todas as camadas. O Ximango sobe melhor com a ajuda das correntes ascendentes, então voei em círculos porque necessitava subir para passar as nuvens. Eventualmente, não poderia ver nada e tinha que descer e tentar passar por baixo. As cartas visuais indicavam fios de alta tensão e antenas de rádio, mas não os urubus (bem maiores que os nossos), então tive que estar na alerta o tempo todo.
Quando finalmente esse maluco tempo abriu um pouco, eu já tinha gasto duas horas do meu precioso tempo e da gasolina e quase nada progredi na direção certa. Uma hora mais tarde, uma camada baixa de nuvens estava se formando abaixo de mim. Continuei a 4000 pés mas ela se tornou sólida, me forçando a retornar por 30 minutos para evitar ficar preso por cima dela. Estava seriamente preocupado se daria o tempo para alcançar Mumbai (Bombaim) antes do por do sol, isto para não mencionar a gasolina perdida por tantos desvios. Conclui que para a segurança do vôo, seria melhor pousar em Bhopal, reabastecer e sair bem cedo na manhã seguinte. Eu não tinha nem idéia dos problemas que isto me traria. Eles insistiram que eu não poderia sair do aeroporto sem fazer alfândega (detalhe: não há serviço de alfândega em Bhopal). Disse exaustivamente durante quatro horas que já tinha feito a alfândega em Patna. Quando finalmente chegou o Chefe da Alfândega vindo de não sei que cidade, um homem sensato que confirmou o que falava o tempo todo: eu não precisava fazer alfândega porque já fora feito em Patna. Mas nisso perdi quatro horas.
Estava marcada uma grande coletiva de imprensa em Mumbai e eu só esperava que o tempo estivesse bom na manhã seguinte e que as autoridades não fossem complicar minha vida mais uma vez com bobagens.
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